Thursday 2 September 2010

May the force be with me.

Decidi ir a duas aulas seguidas (daquelas mesmo bera - RPM e depois Body Pump) no ginásio; eu, que consto no dicionário ao lado do termo 'moleza', prevejo que isto não me vai correr nada bem. De qualquer modo, se sobreviver, escrevo sobre isso aqui mais tarde. 




Sunday 29 August 2010

3 coisas sem nada a ver umas com as outras

1) FIM DE FESTA
Quem nunca ouviu a expressão desoladora 'estás com ar de fim de festa'? Tipo, quando ias estavas fresca, divertiste-te, mas agora no regresso estás assim meia escangalhada e triste porque o bem bom já acabou. Pois eu fui de férias e descobri um santo remédio para o ar de fim de festa. É mais ou menos assim: quando chegar o último dia de férias (um dia que por definição é sempre uma espécie de domingo cinzento vezes mil), agarrem o vosso cônjuge com uma mão e na outra empunhem o vosso VISA; não descansem até  terem as próximas férias marcadas! Hora e meia depois, tínhamos 5 vôos marcados com o itinerário  Porto - Londres - Estocolmo - Copenhaga - Genebra - Londres - Porto e já cá cantam os guias American Express das duas cidades escandinavas, onde passamos 3 dias em cada. Por isso, em vez de ficarmos deprê ao vermos o tórrido Algarve afastar-se cada vez mais e mais na A2, temos aquela coisa brilhante chamada antecipação à qual nos podemos agarrar nos próximos 3 meses. E sem ficarmos tesos - tudo low cost. Esta coisa de viajar de avião por menos dinheiro do que qualquer outro meio de transporte não vai durar para sempre, por isso mais nos vale aproveitar para conhecer este mundo imenso enquanto ainda há camada do ozono e, assim, ter qualquer coisa para contar aos netos no futuro.

2) DADDY LONGLEGS
Viemos há bocado de ver este filme. Não me lembro agora de quem é que faz a distribuição deste filme em Portugal, mas sem entrar em pormenores sobre o filme em si, gostava de saber qual a razão misteriosa é que o distribuidor atribui o título 'Vão-me Buscar Alecrim' a um filme cujo título original é Daddy Longlegs. É que não é uma questão de tradução; é mesmo uma questão de se inventar radicalmente um título para um filme. Just wondering.

3) TOD'S
Ando a namorar umas botas Tod's (my apologies, não encontro imagens delas na net, por isso aqui vai uma descrição preguiçosa: são de pele, cordões, salto médio-alto, um pouco acima do tornozelo, pretas, sola de borracha com as típicas bolinhas - o que é bestial nesta calçada portuguesa traiçoeira -, um misto entre desportivo e urbano. São, em suma, tudo o que uma bota de outono deve ser, nada mais, nada menos. Chiques, no-nonsense, e sem afirmarem ruidosamente a sua chiqueza. São-no e pronto. Depois ocorreu-me que o dinheiro que elas custam dá para ir à Suécia e à Dinamarca em companhias low cost e ainda sobra para recuerdos.



Thursday 12 August 2010

It blows.

Em dias tão ventosos como o de hoje, vestir mini-saia ou sair à rua em cuecas dá exactamente na mesma coisa.

Eureka!!

Já descobri a razão do fenómeno sociológico das sessões fotográficas na praia! O fenómeno deve-se, nada mais nada menos, ao concurso Miss Maxmen 2010! As fotos que eu vi não são para o Facebook, afinal. São (e isso sim) para dominar o mundo. É que estão lá todas e são mais que muitas. Duh!

Ok.

Hoje decidi dar uma hipótese ao 5 Para A Meia Noite e já me arrependi. É absolutamente atroz, a começar por este palerma deste Nilton.

Monday 9 August 2010

Observações de Índole Sociológica (acho eu) - pt.1

Nas últimas vezes que fui à praia, pude observar o que pode ser uma tendência comportamental curiosa. É mais ou menos assim: duas adolescentes (vão sempre aos pares), possivelmente entre os 15 e os 19 anos, dirigem-se ao mar, de máquina fotográfica em punho. Quando a água lhes dá pelo joelho, uma incumbe-se do papel de fotógrafa e a outra encolhe a barriga, empina o rabo, faz aquele olhar felino por entre as madeixas de cabelo esvoaçantes e, assim do nada, no meio da praia cheia de gente, tem lugar uma sessão fotográfica. Corto o dedo mindinho em como vão direitinhas para o Facebook.

Não acho relevante fazer juízos de valor das meninas (nunca vi rapazes a fazer isto), nem acho interessante. Mas acho curioso um outro aspecto, que se prende mais com a interacção entre rapazes e raparigas, ou seja, os grupos deles e delas estão ambos lá. Eles a jogar à bola, elas a tirar fotos ensaiadas. Depois, especulo eu, elas põem-nas no Facebook e eles fazem 'Like'. Eu cá não estou por dentro dos códigos dos namoriscanços de verão na adolescência, mas parecia-me mais directo e linear que, já que o cenário é a praia e o objectivo é seduzir o sexo oposto, que a coisa se concretizasse logo ali. Ou seja, mediar a coisa mais ainda é ir 'dar uma ganda bólta'. Dantes achava brega aquela do "olá, posso te conhecer?", mas não sei era pior do que ir para o Facebook pôr Likes.

Questão Fracturante da Semana - Droit de suite

É hoje que inicio uma espéc'e de rúbrica semanal, a Questão Fracturante da Semana. Embora tenha dúvidas se serei capaz/terei pachorra para dar continuidade à mesma de forma sistemática, ontem deparei-me com um debate muito interessante que realmente me dividiu; o assunto em questão chama-se, em inglês, 'artists resale rights' ou, no original francês 'droit de suite'. Não descobri ainda maneira melhor de dizer isto na língua de Camões para além de 'direito de sucessão', mas se algum de vocês souber, que tenha a bondade de me elucidar.

O direito de sucessão tem vindo a criar uma cisão entre os que, de alguma forma, estão envolvidos no comércio da arte, sejam eles galeristas, coleccionadores ou artistas. Em Portugal não me deparei ainda com nenhuma discussão, mas lembro-me do assunto surgir na cadeira de Art Business (cujo professor foi, possivelmente, a figura mais inspiradora do meu percurso académico, o mítico Henry Lydiate) e de recentemente me chamar a atenção no Art Newspaper.

E, without further ado, o droit de suite resume-se a quê? Primeiro, é preciso contextualizar a coisa: imagine-se, por exemplo, um situação em que o coleccionador X vai à galeria Y e compra um quadro do artista Z por 500 euros, numa altura em que ainda ninguém ouviu falar do artista Z. Numa situação deste género, o coleccionador X apenas compra o quadro de Z porque gosta dele, porque 500 euros é uma verdadeira pechincha. Se o coleccionador X comprasse com o intuito de vender no futuro, e com isso ganhar dinheiro, não o faria num artista completamente desconhecido.

Contudo, anos mais tarde e por alguma razão, o artista Z tem a sorte de ver a sua obra  reconhecida pelas instituições e pelo mercado, o que faz com que um quadro seu deixe de valer 500 euros, passando a valer 100.000. O coleccionador X, que anos atrás comprou o quadro do artista X por 500 euros, decide vendê-lo, obtendo assim um lucro de 99.500 euros. É aqui se entra a questão do droit de suite: é legítimo o artista X ter direito a uma parte deste lucro?


A coisa bifurca-se, de grosso modo nas duas seguintes perspectivas: a do coleccionador e a do comerciante. O coleccionador pode argumentar que o droit de suite é uma violação da propriedade privada, que cada um tem o direito de alienar aquilo que é seu; que os artistas que se queixam de ficar de fora nesta escalada de preços são os que já são ricos, e que não estão a fazer mais do que barafustar com os coleccionadores que, anos antes de se tornarem famosos, apreciaram e apostaram no trabalho deles; que o droit de suite só se aplica a obras de arte acima de um certo valor, pelo que a ideia do artista pobre e explorado   não encontra nisto uma solução; que o artista devia, na verdade, regozijar-se com o facto de o seu trabalho passar a valer muito mais do que valeu há tempos, pois significa que os próximos quadros que produzir serão muito mais valiosos do que tinham sido até então.

Do outro lado do ringue, o comerciante ou galerista vê a coisa de outra maneira. É mais provável que defenda a perspectiva de que é algo indecente que alguém obtenha lucros significativos graças ao trabalho de um artista vivo. A ausência deste tipo de legislação obriga a que as transacções sejam feitas de forma mais obscura e silenciosa, uma vez que não convém que se saiba quem compra e vende o quê. Quando se descobre (o mundo da arte é sensivelmente do tamanho de um penico), é o fim-do-mundo-em-cuecas. Convém muito mais ao galerista que haja droit de suite porque é ele o intermediário entre coleccionador e artista, e caso lhe fuja a boca para a verdade, quem sabe numa vernissage, depois de um copito de Ruinart a mais, tem as costas protegidas por uma legislação que o obriga a ser transparente.


Ora, eu ainda não escolhi de que lado estou. Parece-me que cada um dos intervenientes tem razões perfeitamente válidas do seu lado, já para não dizer que sou a favor do reconhecimento do artista quando  o seu trabalho é valorizado no mercado. Sem o artista, o trabalho não existiria, logo, nem o galerista nem o coleccionador fariam dinheiro. Contudo, este irá beneficiar no futuro, se continuar a produzir e a fazer circular os seus quadros no mercado. Afinal, segundo o site ArtLaw  (do prof. Lydiate), é apenas uma pequena porção que reverte para o artista; embora, se é uma pequena porção, o coleccionador não deveria oferecer tanta resistência na hora de abrir mão dela. Enfim, o que é pequeno e o que é grande?


A Inglaterra e o estado da Califórnia já aprovaram o direito de sucessão. Nova Iorque, por exemplo, está de fora. Which side of the fence are you on?


                                      

Friday 6 August 2010

Mad Men - "It's toasted!"

Parece que já está no ar desde finais de 2008 e só agora, quase dois anos depois, é que descobri a proverbial pólvora.
Estou obcecada com isto por muitas razões, entre as quais, and in no particular order, os quadros no escritório da antiga agência de publicidade Sterling Cooper, o guarda-roupa das secretárias (que concerteza me fará bocejar de tédio na próxima vez que puser os pés na Zara), a interacção entre homens e mulheres, aqueles beijos intermináveis em que a interveniente feminina tem os lábios besuntados de baton vermelho e ainda assim não mancham a cara do masculino. Sugere ainda o tratamento dos cidadãos afro-americanos e, embora muito pouco, a questão da homossexualidade (que se ainda hoje é um bocadinho indigesta, na altura devia era um monstro multicéfalo. E depois, para além de tudo isto, há ainda a figura de Don Draper. Suspiro.

Primeiro, como disse, foram os quadros. Uma licenciatura, um mestrado e meio projecto de investigação de doutoramento não me qualificaram para identificar mais do que um belíssimo Mark Rothko, vermelho e amarelo, na sala do presidente da agência. A câmara passa por ele sem prestar muita atenção, sem o bajular, ainda que nos anos 60 Rothko fosse já um artista muito procurado, como sugere a encomenda do Seagram Building (desenhado por Mies van der Rohe), mais precisamente do seu chiquíssimo restaurante Four Seasons.  Tirando o tal Rothko, há mais alguns quadros muito interessantes, todos com aquela composição abstracta 'all over', em que não se compreende limites de forma nenhuma, mas uma profusão de linhas a a preencher o plano pictório, muito ao jeito do pós-guerra americano. Uma delícia. (nota: ao que parece o mobiliário é uma espécie de best of do melhor design da época)

O próximo na lista é o guarda-roupa das secretárias; e por falar em secretárias, há a personagem Joan Halloway, toda ela lips, tits and hips. Hoje vestimo-nos mais ou menos livre e descomplexadamente, e mesmo sem discorrer sobre as conquistas do meu género no campo da paridade, e sem problematizar muito a questão,  não consigo conter um certo fascínio pelo efeito que as roupas da época têm nos outros. Cinturas minúsculas, muito busto, ênfase nas ancas... e os ombros à vista, os tornozelos descobertos. Não sei se uma mini-saia é mais interessante, sinceramente. Não digo nada de novo ao referir aquela coisa do mistério, que é preciso tapar aqui e ali para deixar alguma margem para a imaginação e que revelar tudo de mão-beijada é meio caminho andado para que o interesse se esvaneça. O guarda-roupa desta série é o argumento mais forte que alguma vez vi a favor da relação proporcional entre imaginação e vestuário. E aquela Joan Halloway, tem uma silhueta de fazer corar uma cordilheira.

Embora poderosíssimas na forma como se apresentam, as mulheres são tratadas com um tipo de condescendência que, nos dias de hoje, é difícil de engolir. São chamadas de 'sweetheart', 'red' ou 'ginger', dependendo da cor do cabelo, ou simplesmente 'girl'. Poucas são as vezes em que se ouve um dos homens a chamar a secretária pelo nome. Um nome define-nos, certo? Eu sou a Ana, ou sou a Maria, ou a Sónia. Uma pessoa dirige-se a mim e trata-me pelo nome que me foi atribuído, como que um resumo da minha identidade, que é sempre um complexo conjunto de coisas. Mas ali, não. Ali a identidade das raparigas é uma coisa muito plana, muito reduzida: rapariga, ruiva, etc. É a mesma coisa do que chamar preto a alguém. É reduzir a identidade daquela pessoa a uma característica física sua, e assim negar-lhe a sua complexidade individual. Obviamente, escusado será dizer que não há exemplo de alguém (na série ou fora dela) tratar um homem por.. uh, homem. Ou loiro. Ou grisalho.
Há, contudo, a personagem de Peggy Olson, uma rapariga que começa por ser secretária mas que, por demonstrar uma inteligência excepcional (e graças à abertura do chefe Don Draper), acaba por se tornar uma enorme promessa no âmbito do copywriting, conquistando mesmo um estatuto igual ao dos seus colegas homens e o seu escritório pessoal. É a mais feiinha de todas; suponho que está aí um complexo por desconstruir.

Peggy, ainda que feiinha, ou menos deusa, porque é isso que as outras são, são umas deusas, elas todas, tem direito a alguma acção com o colega Pete Campbell e um ou outro estranho, entre outros. Pete Campbell é casado. Há MUITO, mas MUITO adultério nesta série. Eu não percebo nada de adultério e não tenho curiosidade, mas se tivesse, creio que estaria satisfeita por agora. O tal Don Draper (um McDreamy versão vintage, misterioso, bonito à moda antiga, um personagem complexo e profundo) tem uma mulher que é deslumbrante elevado a um bilião de infinitos, e ainda assim pula a cerca a cada rabo de saia com que se cruza. É preciso mencionar que ele tem bom olho e que as escolhe a dedo. Mas a  que tem em casa é um assombro de mulher. Isto leva-nos à questão dos beijos sem borrar o baton. É das poucas vezes que me dou conta de que é só ficção (na vida real não há hipótese), porque de resto, é provavelmente a série mais absorvente que alguma vez vi.

Quando consigo descolar, dou-me conta que o mundo contemporâneo ganha numas coisas (coisas muito boas e muito importantes, note-se) e perde noutras. Ganha certamente na igualdade de género, o que não quer dizer que não haja mais nada por conquistar, nas questões raciais (idem), e nos preconceitos em geral. Por outro lado, perdeu-se um certo charme, perdeu-se uma forma de agir em detrimento da sede do imediato e da gratificação instantânea. Concedo que os argumentos que acabei de propor são pobres, mas de qualquer maneira, acredito mesmo que há aspectos nesta série que realmente oferecem uma nova perspectiva sobre o ano 2010.

Thursday 29 July 2010

Ontem, lá me arrastei dolorosamente até aquele estabelecimento de tortura nas Amoreiras, vulgo ginásio, para mais uma sessão masoquista. Tudo seria horrendo se não fosse a televisão ligada na MTV que está mesmo em frente da passadeira em que inicio o meu ciclo de auto-flagelação. Ontem, enquanto corria e transpirava como um tourinho de médio porte, começa a dar uns desenhos animados que se chamam Drawn Together. Fixem este nome. É um pequeno portal mágico de absoluta felicidade.

A graça destes desenhos animados é uma só: politicamente incorrecto levado ao extremo - há de tudo, humor negro, estereótipos raciais, preconceitos associados com a sexualidade, ao excesso de peso, etc, e a verdade é que é absolutamente hilariante. E desenganem-se se acham que isto já é old news depois dos Simpsons, Southpark de Family Guy e American Dad, pois estas séries (embora ingualmente brilhantes) conseguem ser mais subtis na utilização do políticamente incorrecto. Drawn Together é só sobre isso e cada deixa de cada personagem serve apenas para sublimar isso mesmo. As personagens vivem numa casa tipo Big Brother e não há nada que lhes saia da boca que não seja obsceno. Como eu não sou uma comentadora de televisão genial como o Charlie Brooker (Mr. Brooker, me love you long time), o melhor é verem por vocês mesmos. Não me agradeçam, que não é preciso:

http://fliiby.com/file/117361/r3p8rgilgc.html

Wednesday 28 July 2010

Não aguentava nem mais um dia com o layout antigo do blogue. Juro, fazia-me calor. Por isso gramamos agora com este branco sujo insípido (mas fresquinho como uma brisa).

Monday 19 July 2010

Nos últimos dias, uma série de coisas sem qualquer relação entre elas; abri, pela primeira vez, um livro do Fernando Namora (um do Círculo de Leitores de 1975 que o meu pai deixou ficar para trás quando levou a colecção com ele), iniciei sem grande brio o projecto de investigação para o doutoramento (se é que mo aprovam...), fui a uma praia tão apinhada de gente que o senhor que chegou mais tarde só arranjou lugar para se deitar mesmo à minha frente, sendo que se se esticasse mesmo acabaria por me enfiar o pé pela boca dentro. A maneira ideal de nos recordarmos daquela aversão insuportável que só a proximidade física com um estranho provoca. 


O calor persiste. Os dias fundem-se uns nos outros, derretem-se entropicamente. Agora é dia, logo é de noite, depois é dia e é sempre assim, uma coisa arrítmica. O sábado é igual à terça-feira, e o domingo, se uma pessoa não abre a pestana, passa insuspeito por uma quinta-feira. Instalou-se a desordem e não há maestro que marque o compasso.





Teresa Margolles (MEX) - En el aire/ In the air, 2003
bolhas feitas com água da morgue, usada para lavar corpos antes da autópsia









Friday 2 July 2010

O Calor de Lisboa

É imenso. É tal que, mal cheguei a casa, larguei o vestido como as cobras largam pele inteira. Adoro este calor infernal, por mim era assim todos os dias do ano.

Thursday 1 July 2010

Hotel Rwanda/A Moda do Africanismo/O Fetiche do Exótico

Tenho noção do quanto este título está infinitamente para além do pouco que sei, mas enquanto via o Hotel Rwanda (um filme que já não é novidade nenhuma) surgiram-me algumas questões que gostava de expor aqui. Este é um filme que, em certa medida, é duro de ver. Embora tenhamos a clara percepção de que não passa de uma dramatização, há sempre algo subjacente ao logo do filme que nos sugere que os factos foram mil vezes mais terríveis do que alguma vez seria possível transparecer numa mera representação.

Para quem o terrível genocídio de 1994 passou ao lado (como a mim própria, que tinha na altura 9 anos), a história é mais ou menos esta:

O Ruanda é um país africano, cercado geograficamente pela Tanzania, Burundi, Uganda e pelo Congo. Foi inicialmente colonizado pela Alemanha e, mais tarde, por alturas da primeira guerra mundial, viu a sua soberania ser transferida para a Bélgica. Se os alemães foram pouco interventivos, os belgas envolveram-se mais afincadamente em aspectos como a saúde, educação e agricultura. Socialmente, vincaram severamente as diferenças entre duas supostas tribos, Hutus e Tutsis; digo 'supostas' porque só há milhares de anos atrás se poderiam discernir estes diferentes grupos de gente que, entretanto, se foi misturando num só. Isto significa que quando a soberania belga decidiu emitir documentos de identificação para a população, discernindo quem era Tutsi e quem era Hutu, o fez de uma forma completamente arbitrária: os mais altos, de pele mais clara e de nariz mais estreito eram Tutsis e os mais baixos, de pele mais escura e nariz mais largo eram Hutus.
Ou seja: o branco europeu chega lá, inventa um critério, separa um povo que se mesclou durante milénios, e dá preferência a um deles (os Tutsis, que já tinham sido beneficiados anteriormente pelos alemães), ou seja, segrega-os e antagoniza-os. Dividir para reinar, sem tirar nem pôr.

Com o crescente poder conferido às elites Tutsi, estas começam a desejar a independência da Bélgica, algo que, como aconteceu mais tarde com países como Angola e Moçambique,  chamou a atenção do bloco Comunista, merecendo-lhe o seu apoio. Descontentes com este cenário, os Belgas resolvem então virar a proverbial casaca e começam a favorecer os Hutus, a suposta etnia até então preterida. Isto resulta numa vaga de violência anti-Tutsi - só assim, porque a Bélgica se livra de um conflito independentista  virando o jogo para um conflito étnico e prolongando, assim, o seu domínio colonial.

A história continua, obviamente, mas para onde quero chegar basta ficar por aqui. Interessa-me muito a noção de colonização, ainda que seja um assunto com longas e portentosas barbas. Que raio de mania tem o homem branco ocidental, que chega a África, assenta arraial, e se acha com poder de decretar regras a povos nativos. Como é que isto foi sistematicamente possível?? Quem souber que me diga, por favor. Só me ocorre a possibilidade da força bélica, superior às armas comparativamente mais simples e menos letais dos  nativos, pelo menos até à Russia se interessar e inundar aquilo de kalashnikovs. Mas, como dizia, é incompreensível como é que os europeus se safaram nesta apropriação sistemática de territórios alheios e lá se instalaram, literalmente, de armas e bagagens. As armas são mesmo uma merda; o poder de tirar a vida a outra pessoa parece ser, realmente, supremo. Faz lembrar o Ensaio Sobre a Cegueira, em que, quando um dos grupos de cegos se apodera de uma arma, imediatamente adquire o poder de obter tudo o que considera de valor do outro grupo: sexo, objectos pessoais e dinheiro. Enfim, é perverso demais.

Por falar em perverso, há ainda a questão 'étnica'. Esta porcaria deste critério de classificação de pessoas NUNCA trouxe nada de bom. Quanto muito, trouxe sérias vantagens a esse chico-esperto que se lembrou de classificar - olá, homem branco ocidental, é de ti que falo! O homem branco, o classificador, foi esperto quando teve a ideia de classificar porque criou a noção do Outro. E o que é que isto quer dizer? É mais ou menos simples. Suponhamos que chamamos besta a um tipo, certo? Com isto, fazemos duas coisas: definimos esse gajo como uma besta e, ao mesmo tempo, demarcamo-nos desse conceito, ou seja, ele é uma besta, ao contrário de mim, que não sou, até sou uma tipa à maneira.  O mesmo se passa com o classificador, o homem branco ocidental: encontra pretos, amarelos, vermelhos; entre os pretos, vê uns mais altos, uns mais baixos, uns mais gordos e uns mais magros, e assim, o classificador classifica o que vê, isentando-se a si próprio de classe, pois o seu papel é neutro, é o de classificador. Se acham que o que acabei de dizer é um disparate de todo o tamanho, só tenho uma coisa a dizer sobre isso: chamar preto a alguém é insulto, e chamar branco a um gajo é uma perda de tempo.

O fim da picada, o cúmulo desta porra toda é o homem branco ocidental instrumentalizar essa classificação (como se fôssemos detentores de algum estatuto divino) para submeter povos aos seus interesses. Para segregar gente e criar conflitos entre ela; enfim, entretê-los a matar-se uns aos outros enquanto o colonizador aproveita a distracção causada pelas tensões internas para se instalar sem grande oposição dos nativos. Até que o povo arrebita e a coisa se agrava, como no massacre de 1994 no Ruanda e os belgas zarpam dali à força toda, sacudindo as mãos como quem diz 'o nosso trabalho aqui está feito, está na hora de ir para a nossa civilizada casinha!' Enfim, é demais!!


Hoje em dia, contudo, já não há colonização, certo? Há, já se sabe, o pós-colonialismo, em que já não se trata de açambarcar território geográfico (agora já não fixe dizer que 'Portugal é uma única nação, do Minho a Timor'), mas sim de explorar países africanos no sentido de obter o máximo proveito dos seus recursos naturais, para que as grandes multinacionais possam crescer e aumentar exponencialmente os seus lucros, isto graças a parcerias com as elites africanas, que alinham neste esquema perverso que favorece os interesses estrangeiros em detrimento dos interesses internos. Mas não era disso que eu queria falar a seguir. Creio que é perceptível o tom de auto-acusação neste meu post. Tudo isto a mim me parece vergonhoso. Lembro-me perfeitamente de, no primeiro ciclo, aprender sobre o passado imperialista de Portugal, e do tom carregado de orgulho da professora a mostrar-nos no mapa onde tínhamos chegado. E lembro-me de ter pena de como Portugal se tornara outra vez pequenino no meu tempo, quando antes o país tinha sido tão grande e se espalhava pelo mundo fora. E eu achava que naquela altura, Portugal devia ser mais forte e mais importante do que a Espanha e até do que a França.

Quando eu era pequena, ainda se glorificava esta barbárie que foi a colonização. E passaram-se muitos, demasiados anos até eu ouvir, pela primeira vez, uma voz crítica que falasse do direito de auto-determinação dos povos. - nota: "A autodeterminação dos povos é o princípio que garante a todo povo de um país o direito de se autogovernar, tomar suas escolhas sem intervenção externa, ou seja, o direito à Soberania. de um determinado povo de determinar seu próprio status político. Em outras palavras, seria o direito que o povo de determinado país tem de escolher como será legitimado o direito interno sem influência de qualquer outro país." - E que me mostrasse que, até então, nós, os portugueses (e se calhar outros europeus com passado colonial) nos comportávamos como fedelhos armados ao pingarelho, que comparam a importância do seu país pela extensão do seu território ultramarino como quem mede pilinhas. Por mim, os espanhóis e os franceses e os belgas e os ingleses que levassem a porra da bicicleta.

Acho que são atitudes apologéticas e até algo complexadas como a minha que, possivelmente, justificam, em certa medida, esta moda africanista que se vê por aí. É nestas alturas que gosto de recorrer à cultura de massas (afinal de contas, é de moda que falamos), tipo, assim por alto, a Rihanna, mais especificamente no videoclip da música 'Rude Boy'. É vê-la, natural de Barbados, vestida de padrão de zebra contra uma parede a fazer lembrar os rabiscos primitivistas de Keith Haring, cara coberta por pinturas quase tribais e colares de contas coloridas, toda ela um eco do imaginário exótico em que reflectimos as nossas impressões da cultura africana, em algumas partes já mesclada com nuances mais urbanas:


Ou mesmo, e já que falamos de moda, este exemplo de uma colecção decente da uber-chique Louis Vuitton, cheia de leopardo e contas coloridas:


Ou, ainda, em toda esta colecção recente de Dries van Noten (se nunca ouviu falar, é porque não é fashionista, pbtpbpbtpbt!), cuja mistura aparentemente aleatória de padrões remete para a indumentária colorida e ritmada das mulheres africanas:






É por isso que é inevitável ver isto de uma perspectiva algo cínica; não é, de todo, como olharmos para o legado cubista de Picasso e reconhecermos nele tanta influência africana. Picasso viu na vastidão da cultura africana pano para mangas e, décadas de modernismo depois, andamos nós a fazer mangas de pano que ressoam assim qualquer coisa de exótico, que ainda retratam o tal Outro. Se com Picasso a curiosidade e o encanto eram genuínos, a meu ver, hoje trazemos à cultura de massas estes elementos mas fazêmo-lo complexadamente, conscientes da vergonha que foi um dia termo-nos instalado acima dessa cultura local e tentado substituí-la pela nossa. Agora, parece-me, tentamos o oposto: tentamos, quanto mais não seja durante a estação Primavera-Verão, trazer um pouco da cultura do Outro para junto da nossa.

Para terminar, deixo-vos com algumas obras de um dos artistas mais espectaculares que alguma vez me passou pelos olhos e por estes meus modestos neurónios. Chama-se Yinka Shonibare (Inglês/Nigeriano) e aqui ficam algumas imagens do seu trabalho, que, a meu ver, expõe de forma infinitamente mais eficaz e eloquente todos estes assuntos que abordei tão incompetentemente neste post:














Friday 18 June 2010

Ficou-me atravessada

...o raio da conversa sobre a selecção francesa de futebol. Citou o Sarkozy quando disse que a França não se revia na sua selecção de futebol devido à diversidade étnica (tem africanos e árabes e até ETs, se não me engano); e que tinha, pura e simplesmente, por convicção que aquela 'selecção' de indivíduos não representava os Franceses. Eu sou fervorosamente contra este tipo de posições, por três razões muito simples:


1) Sarkozy é o presidente de TODOS os Franceses, por isso devia ser o primeiro a não apontar etnias e credos;

2) Há franceses brancos, pretos e amarelos, que adoram Jesus, Ganesh e Alá; há filhos de Argelinos e filhos de Senegaleses que nasceram em França, ali foram criados e muitas vezes nem sequer puseram um pé em solo Africano. Porque raio se há-de negar que a identidade nacional e cultural destas pessoas é Francesa?! Obviamente, muito do que somos aprendemos com os pais e restante núcleo familiar, mas a escola, as actividades de lazer, a cultura francesa não escapa certamente a estas pessoas, não? A FRANÇA É UM PAÍS DE IMIGRANTES! GET. OVER. IT.

3) É preciso uma dose obscena de lata para um país como a França se indignar com presença deste vasto número de 'estrangeiros', como se tratasse de alguma espécie de contaminação. A França teve um vasto império colonial que chegou practicamente a todos os continentes. Contaminadora foi a França, séculos a fio! A colonização foi um processo bárbaro e brutal que instrumentalizou a opressão, a violência e a escravidão de povos; quero com isto dizer que a França tem uma história repleta de invasões e barbárie. E agora o Sarkozy fica cheio de alergia por causa das comunidades de imigrantes (mesmo os de segunda e terceira geração) a infiltrar essa preciosa minoria de franceses brancos e católicos (e, já agora, devidamente munidos de boina na cabeça e baguette debaixo do braço)! 



Dizia eu 'mas eles nasceram em França, cresceram em França, este é o país deles'. Não adiantou de nada. O problema continua a residir no facto de serem pretos ou muçulmanos, mesmo que não se queira admitir. Até quando vamos andar nisto?! Depois gramamos com palermas como o Deco, o português mais contrariado que aí anda,  que tem tanta afinidade com Portugal como com a Gronelândia-de-Cima. Ser branco neste mundo globalizado: priceless.





EDIT: e mais - o que esta selecção pode, no máximo, não fazer, é representar as expectativas, ou o estereótipo, ou a concepção que o Sarkozy (e o meu interlocutor nesta conversa) tem e faz sobre o o que é a França. Estas expectativas não adiantam absolutamente nada, afinal a França já não é só mulheres magrinhas a fumar de boquilha e baguettes com brie nos cestos das bicicletas; a França agora é mesmo isto, um melting pot como é Londres ou Nova Iorque, é ir na rua e passar por mulheres de sari, por mercearias de bangladeshis e cafés cheios de algerianos a fumar shisha. Agora a França é assim, por isso, talvez esta selecção represente muito bem a diversidade que presentemente caracteriza a sociedade francesa.

Wednesday 16 June 2010

A subjectividade

Tenho ganas de compreender como é que, desde os anos 90, nos viramos tanto para nós mesmos. Reparem: desde então, tornámo-nos sedentos sobre o que se passa na esfera privada de indivíduos comuns, papamos desalmadamente reality shows, talk shows pejados de confissões sórdidas, revistas cor-de-rosa, etc, etc, etc. O que é que obter informação sobre a vida dos outros acrescenta à nossa? Eu própria faço-o também (basta que vejam o meu post anterior...), mas continuo sem compreender porque é que o faço. Tenho, contudo, as minhas suspeitas:

a) Já ninguém acredita em Deus nem no Pai Natal;
    É possível que tenhamos chegado a um extremo miserável do que foi outrora o humanismo; tudo o que está à nossa volta, bom ou mau, foi construído graças à visão e ciência do Homem, logo, está cada vez mais difícil encontrar alguém que se veja como um elemento passivo num desígnio divino favorável. Assim sendo, e já que afinal os heróis somos nós todos, é possível que vejamos em pessoas iguais a nós (e às vezes piores ou muito piores que nós - sim, Marco do Big Brother, estou a falar também de ti) uma espécie de referência.

b) Procrastinação ou a Arte de Adiar  Fazer o Que Tem Que Ser Feito;
    Por outras palavras, 'marxismo'. Diz a teoria Marxista que o entretenimento serve para nos toldar a razão, para nos emudecer perante a opressão do capitalismo. Não fazendo caso do radicalismo do Sr. Bigodes, acho que os Media demonstram ser muito conhecedores do consumidor; muitas vezes farto dos problemas do trabalho, chega a casa estafado de pensar em orçamentos, em facturas, em notas de encomenda e com a cabeça ainda a latejar da última rabecada do chefe, por isso, que melhor consolo haverá do que ver o programa mais estúpido que aparecer? Ou seja, o consumidor/espectador dificilmente chega a casa e procura informação (para dados objectivos, comparar audiências da TVI e RTP2), quer é esparramar-se ao comprido e ver a senhora que nasceu  sem braços e sem pernas no programa da Oprah. O extraordinário, suponho, em vez de nos inspirar, confronta-nos com a nossa própria mediocridade, da mesma forma que o ordinário estabelece uma ideia de normalidade na qual nos encaixamos facilmente - isto assegura-nos que tudo vai bem com a nossa vidinha. Ou seja: os senhores que puxam os cordelinhos nos Media são mesmo espertos e topam-nos a milhas: com estes programas e estas revistas, tratam-nos como bebés pequeninos: põem-nos à frente de um espelho e nós ficamos rendidos, horas a fio, a brincar com a (nossa) imagem reflectida à nossa frente.


Isto tudo porquê?

Isto tudo porque hoje fui comprar uns cremes (quando me pareceu que o meu Clinique para a cara estava a esvair-se de dia para dia, fiquei a saber que o que faltava no boião estava na cara do namorido), e enquanto procurava o que queria, fui interpelada por uma funcionária da loja a oferecer-me uma amostra de um anti-celulítico, acompanhado das devidas instruções de uso "passa nas pernocas, esfrega no rabiosque". Até aqui, no problem, só foi chato é que hoje acordei com tal bravado que me fiz à rua de vestido curto, num exercício de auto-aceitação e com esperanças de apanhar uma corzinha. E depois vem ela sugerir que eu tenho um problema ao oferecer-me uma solução para ele. Eu preciso é de um milagre, filha! E já agora, se não for muito inconveniente, que não me lixem a cabeça por causa das 'pernocas' e do 'rabiosque'. Mas, como dizia, isto tudo porque, considerando este espisódio, me questionei sobre qual seria, realmente, o interesse de falar sobre isto no blog. Tipo, who cares? Possivelmente, absolutamente ninguém, mas a verdade é que um blog é um espaço de subjectividade (logo, de voyeurismo?). Por isso é que é legítimo vir para aqui dizer que hoje passei pelo recreio do infantário na Àlvares Cabral e dois meninos, dois mini-snipers de bata aos quadradinhos, me atingiram a tiro invisível com as suas mãozinhas em posição de pistola, e que depois, tendo sobrevivido a tal ataque, vi aquela anedota daquele jogo de futebol num tasco no Bairro Alto.



Um dia destes, e ainda a propos deste assunto, falo-vos de um artista que eu adoro, adoro, adoro, que se chama Richard Billingham. Para já, deixo-vos para aqui uma imagem do seu livro 'Ray's A Laugh' (que está ali na minha estante, o que largamente contribui para a minha felicidade), para irem pensando sobre o assunto, se vos der para isso.

Wednesday 9 June 2010

Blogs e assim

Confesso, tenho um desejo ardente de dizer duas ou três coisas sobre as o que ando a ler. Há pouco mais de um ano atrás carregava uma respeitável lista de livros atrás de mim - ele era Homi K. Bhabha, ele era Gerardo Mosquera, ela era Theodor Adorno, enfim, uma panóplia de nomes que qualquer estudante de arte contemporânea tem sempre na ponta da língua e que cita sem parar e a torto e a direito.

Mais recentemente, contudo (assim tipo ontem), dei-me conta que já não são bem estes nomes ilustres que me têm passado à frente dos olhinhos. Tenho lido muito lixo. Ou então não é lixo, são só coisas fáceis, e que leio na internet; não tenho que pensar, não aprendo nada com isso, apenas gosto.  Tipo isto:

A Pipoca Mais Doce (http://apipocamaisdoce.blogspot.com) - Embirro com o nome do blog, que me parece um bocadinho dondoca quando, a meu ver (eu sei que não falta quem discorde), o conteúdo do blog é super engraçado e claramente bem escrito (nada como este, que eu não sou jornalista). Obviamente, é um conteúdo quase inteiramente orientado para um público feminino que perde umas horas por dia a pensar em/fazer coisas de gaja, tipo comprar sapatos (ou à falta de capital, pensar em comprar sapatos ou mesmo babar copiosamente para cima da montra da Fashion Clinic com um ar sonhador) e vernizes ou comentar a aparência das outras, por exemplo. Há também duas rubricas engraçadas, uma em que ela fala dos preparativos para o casório (ideia a que geralmente sou alérgica e que, vindo de qualquer outra pessoa me aborrece de morte) e, principalmente, o hate mail que ela recebe, do mais ressabiado que há. É lindo! E tudo isto, como já disse, muito bem escrito, com muita graça e com um tom irónico que salva todo este blog da pura imbecilidade. Eu gosto!




Karla's Closet  (www.karlascloset.com) - Mais um blog de moda de uma miúda californiana muito cheia de oomph. Pouco expansiva, não diz muito, mas expressa-se muito nas fotografias onde, na maior parte das vezes, enverga belíssimas selecções vintage. Tem um ar de outros tempos que eu adoro e, em síntese, muita, muita classe. É, tal como a blogger seguinte, uma lembrança de que há um elemento-chave na moda que é também importantíssimo nas artes visuais: a composição.  (Hi Karla, if for some reason you bump into this text - since it's got your name on it - and find only a bunch of portuguese gibberish, I'm only using your photo and mentioning you because I'm telling people you're awesome. Hope you don't mind, but if you do, I'm happy to edit this.)



Sea of Shoes (seaofshoes.typepad.com) - Uma texana de 16 ou 17 anos com um bom gosto irrepreensível e muito, muito criativa. No início o tema do blog focava-se mais nos sapatos (alguém que me explique esta obssessão da qual padecemos todas, por favor, fundamentado por teoria freudiana, ou assim!) mas agora aborda mesmo o conjunto todo. Digamos só que, enquanto a Pipoca tem um orçamento de 100 euros por mês para gastar em chaussures, aqui a senhorita Jane Aldridge vai para a escola em cima de uns Givenchy ou de uns Marni como se nada fosse.
Como dizia acima, em termos de composição é uma mocinha do mais competente que há e desde o primeiro momento em que a vi/li, pareceu-me que se trata de uma digna sucessora de uma Anna Wintour. Pinta a jorrar por todos os lados. E uma colecção de sapatos de morrer. Tipo estes Yves Saint Laurent Cage Sandals. *cai para o lado* (Hi Jane, if for some reason you bump into this text - since it's got your name on it - and find only a bunch of portuguese gibberish, I'm only using your photo and mentioning you because I'm telling people you're awesome. Hope you don't mind, but if you do, I'm happy to edit this.)


Cupcakes And Cashmere (cupcakesandcashmere.com) - Mais uma ianque, desta feita de S. Francisco, mas exportada para Los Angeles. Gira todos os dias. O título do blog dá boas pistas sobre o seu conteúdo - moda e comida, coincidentemente duas das minhas coisas preferidas - e não é difícil constatar que ela é muito boa em ambas as coisas. Diz que o truque é cada um encontrar as suas paixões. (Hi Hilary, if for some reason you bump into this text - since it's got your name on it - and find only a bunch of portuguese gibberish, I'm only using your photo and mentioning you because I'm telling people you're awesome. Hope you don't mind, but if you do, I'm happy to edit this.)


The Sartorialist (http://thesartorialist.blogspot.com/) - Vão lá e vejam por vocês mesmos porque é que este blog é tão (o mais!) especial dentro deste género. É que, pela primeira vez, vemos que a inspiração e a criatividade estão nas ruas, não na snobeira dos ateliers.


E pronto, já vêm, que tenho trocado o sagrado pelo profano. Ontem, quem sabe se por  motivo de culpa ou mesmo saudades, lá agarrei na Teoria Estética do Adorno, mas foi como quem já se sente mal por não ir ao ginásio há 2 meses e por isso faz 6 ou 7 flexões no tapete da sala. O que é certo é que eu gosto de ler estes blogs e, principalmente, de ver estes blogs. E à medida que vou pensando no rumo que quero dar a este, mais penso que nada me obriga a ser coerente ou a ter um tema concreto. 'It's my blog and I'll write what I want to.'

Saturday 8 May 2010

I LOVE YOU, PHILLIP MORRIS

Quem sabia deste tal Phillip Morris? Um homem que,durante alguns anos da sua vida, tentou encaixar-se no modelo clássico do marido/pai de família/polícia cumpridor e que - assim, de repente - descobre que afinal é homossexual. E gosta. E em consequência de um grave acidente de viação, tem a derradeira epifania e resolve aceitar-se como tal, encontrando mesmo um parceiro bronzeado e deslumbrante (que no filme é Rodrigo Santoro, que conhecemos como galã das novelas; ou então como a Lady Di, em Carandiru).

A parte problemática começa aqui. Há dois aspectos no filme, que disputam a nossa atenção até ao fim; e digo-vos, nem sempre vence a melhor. Esses dois aspectos, que no filme funcionam em paralelo (e que, a meu ver, deviam estar entrosados) são a) a representação da homossexualidade e b) o carácter do protagonista Steven Russell, que no filme é Jim Carrey.

A questão do conflito entre estes dois aspectos não é óbvia. Foi preciso uma breve cena de sexo entre dois homens (Steve e um anónimo) e mais alguns beijos homossexuais para um número considerável de pessoas abandonar a sala. Eu, convicta progressista, ri-me deles e pensei 'pff, conservadores! Se fosse o Leonardo DiCaprio e a Kate  Winslet deixavam-se ficar. Que púdicos, que reaccionários!' E ao comentar isto mesmo com o namorado, geralmente menos progressista do que eu, ele sai-se com esta: talvez estejam a sair por causa de o filme ser uma merda.
E foi assim que me dei conta dos tais dois aspectos que referi há bocado. Ou seja, eu achei que todo o filme era uma representação da homossexualidade e esqueci-me completamente do enredo. Foi também assim que percebi que a estratégia do realizador (cujo nome não fixei) não foi a melhor ao enfatizar tanto a sexualidade do personagem principal, e ao confrontar tantas e repetidas vezes o espectador com os beijos, o sexo, as manifestações de afecto entre dois homens, o realizador torna a história meramente periférica. O que não deixa de ser curioso por duas razões: a primeira, porque a homossexualidade ainda possui um considerável shock value e, em segundo lugar, implica que há algo de profundamente subversivo neste filme, pois faz-nos questionar o modelo James Bond, com os seus truques e charmes e enrolanços com as mulheres mais bonitas do planeta. Só que neste caso o Steven Russel bate os James Bonds e os McGuyvers aos pontos e enfia-os num bolsinho: a história é verídica.
Como li há dias, 'mais depressa a vida real se parece com a ficção do que a ficção se parece com a vida real'. Damn right.

A história é, afinal, a parte mais fascinante e (infelizmente para todos) só nos apercebemos realmente disso no fim, quando ficamos a saber que, por fazer de todos parvos (o governador do estado do Texas por ter desempenhado funções de advogado sem qualificações, o presidente da imensa multinacional onde conseguiu chegar a CFO, entre inúmeros esquemas inteligentíssimos que pôs em prática para obter os carros, os casarões e o olhar embevecido do parceiro) o expedito impostor Steven Russell levou com uma pena perpétua.

Foi, por isso, com alguma pena, que vi o filme a tomar contornos de comédia, a encorporar mesmo alguns clichés homossexuais. Parece-me, a mim, que não percebo nada, que é um caminho fácil de tomar para chegar ao coração do espectador. Contudo, meia volta, o vigarista par excellence lá fazia mais uma das suas brilhantes artimanhas para se desenvencilhar dos problemas causados pela asneira anterior, e lá a história ganhava terreno.


Posto isto, concluí que não é um excelente filme. Apesar de tudo, não consegui deixar de sentir alguma satisfação ao ver representado um estilo de vida diferente do que aqui consideramos normal. Sempre achei que a sensação de estranheza é algo contra o qual devemos lutar sempre; se, em crianças, é uma defesa, na vida adulta é algo que nos torna cegos, surdos e mudos em relação ao mundo. É preciso confrontarmo-nos com coisas novas, para um dia deixarmos de lhes resistir e assim podermos co-existir sem problemas - como uma espécie de sistema imunitário. Não digo com isto que devemos necessariamente mudar alguma coisa em nós para sermos nós também alternativos; digo apenas que devemos reconhecer outras coisas e reconhecer a essas mesmas coisas um direito igual a existirem, desde que não prejudiquem ninguém.

O Jim Carrey prejudica alguém por estar aos beijos com o Ewan McGregor? Também acho que não. Contudo, aqueles espectadores que sairam da sala desciam aqueles degraus vincando pura convicção. Tipo, 'NEM MAIS UM MINUTO DESTA MERDA.' E, lá está, assumi eu, que o faziam por repulsa por (aquela) representação da homossexualidade (sublinho a palavra 'aquela', porque a homossexualidade, como qualquer outro aspecto da vida, tem infinitas possibilidades de representação e aquela não era mais do que uma perpectiva sobre o assunto). Mas, depois, no carro, enquanto falávamos sobre este tal conflito, concluímos que só podiam ter saído por causa dos beijos e dos amassos; se fosse porque o filme não prestava, pensariam nos 6 euros que pagaram e deixavam-se ficar.

Wednesday 5 May 2010

No entanto, ela move-se - Parte 1


Desde 2007, este blogue tem estado à deriva por esse cosmos cibernético, à espera que, num momento inspirado ou de procrastinação, eu me dignasse a deitar para aqui umas linhas. Não o fiz porque não tinha nada para dizer.

Não que tenha progredido muito desde aí - ainda não tenho uma mensagem urgente, mas agora começo a pensar que 'vai do começar'. Decidi começar por explicar o título do blog, que creio ser uma expressão brilhante, no seu contexto. Ouvi a história pela primeira vez há muitos anos, contada pelo meu pai, admirador das ideias e do progresso científico: Galileu Galilei, pai do heliocentrismo, foi levado a julgamento pelo Santo Ofício em consequência da absoluta heresia dessa mesma teoria científica. Quando já se tinha estabelecido e validado que a Terra tinha uma localização fixa (diz a Wikipedia que foi graças a Ptolomeu), a descoberta caiu mal ao Papa da altura, que decidiu manter Galileu em prisão domiciliária até ao fim da sua vida. A melhor parte da história é, infelizmente, uma lenda, mas de todo modo é genial - diz-se que, no julgamento, depois de ter desmentido o heliocentrismo, Galileu declarou discretamente 'No entanto, ela move-se!'

Bem ou mal contada, esta história sempre me fascinou por duas razões: porque expõe as implicações de ter razão antes do tempo e porque a convicção do Galileu mantém-se inalterada pela obrigação de ter que agir e que se manifestar em conformidade com o resto das pessoas.

Há um artista plástico português cuja obra admiro muito, chamado João Pedro Vale. Aqui vai um excerto da minha tese de mestrado, em que falo sobre a sua obra 'However, It Moves', traduzido do original Inglês, em cima do joelho:


'Hoje em dia, a colonização é uma mera recordação remota que gera pouco ou nenhum debate em Portugal. No passado, Salazar insistia em manter o seu domínio sobre as colónias ultramarinas - isto, no século XX, enquanto outros colonizadores Europeus moviam esforços de forma a remover a sua presença do continente Africano. Persistem ainda vários monumentos ao longo de algumas cidades costeiras portuguesas, celebrando (ainda?) as descobertas e os seus protagonistas.

Visualmente dominantes e em estilo militar, esses monumentos parecem reavivados em 'However It Moves!, 2007 . Como uma figura híbrida e mitológica, esta escultura de sal parece descender do cruzamento entre um bolo de noiva e uma fortaleza militar. - em suma, uma verdadeira antítese, celebração e conflito num só objecto. Muito frequentemente, no trabalho de JPV, o espectador é bombardeado por uma percepção ambígua da escultura, algo que só consigo comparar com aquelas imagens planas, a preto e branco, em que a àrea em branco descreve um objecto e a àrea a preto descreve um objecto diferente, sendo impossível ver ambos em simultâneo.

Se escolhermos ignorar a superfície decorada e imaculadamente branca, somos confrontados com um objecto impenetrável e hermético, com canhões ameaçadoramente apontados a nós; por outro lado, se optarmos por observar a superfície adocicada deste objecto de dois andares, imediatamente nos salta à mente o típico bolo de noiva, coberto de açúcar em montinhos decorativos e numa configuração de dois andares, para chegar para toda a gente.

Uma das possibilidades de leitura desta obra pode, creio eu, referir-se às estratégias de expansão das velhas monarquias Europeias, em que os países eram conquistados e as suas fronteiras (re)definidas de duas formas: ou pela guerra ou pelo casamento dos soberanos.
Para além disso, pode dizer-se que, olhando para trás, o passado português no ultramar resume-se agora nestes monumentos celebratórios despropositados e meramente decorativos. O curioso título desta obra ecoa ainda a lenda que narra o episódio em que o astrónomo italiano Galileu Galilei é obrigado a abandonar e a negar a sua teoria do heliocentrismo. Ameaçado pela pena de morte (e sabe-se que os métodos da Inquisição não eram meigos), Galileu despacha-se a negar o seu modelo científico, sem deixar, contudo esta nota: 'no entanto, ela move-se'. Esta afirmação pode, assim, funcionar como uma subtil afirmação da uma percepção alternativa à versão oficial das coisas, um ícone de perseverança em relação a algo que desafia o que está geralmente estabelecido, uma declaração sobre a imparável mobilidade das coisas.'

Acho esta ideia muitíssimo interessante. Quanto do que achamos que sabemos não passa de uma versão? A História, por exemplo, é a maior versão de todas, é a voz dos que a contaram, e os que a contaram são um grupo muito restrito composto por, geralmente, homens, brancos, heterossexuais, Cristãos e ocidentais. Num mundo tão grande e tão vasto, porque é que damos ouvidos só a este grupo? Porque lhes é permitido 'universalizar' as suas perspectivas? O que é feito da voz da maioria?

Será que a maioria não é uma questão numérica? Será ela, na verdade, uma questão de influência, uma questão de elite, logo, uma questão de poder? Não sei, mas acho importante pensar nisto.


Fica, por enquanto, por aqui a primeira 'esculpidela' neste blog ainda amorfo. Acabo só com uma última observação sobre o nome Galileu Galilei, para mim o melhor nome de todos; tenciono, um dia, quem sabe, ter um filho a quem possa chamar Rodrigo para que, tal como o mítico astro-físico, possa apresentar-se com uma sonante aliteração, isto é, Rodrigo Rodrigues.
Quem sabe se por alturas da próxima geração seja menos perigoso ter-se razão antes do tempo, não vá o meu futuro rebento vir a ser algum prodígio.